Como a CABTAL concluiu nove OS Novos Testamentos em regiões devastadas pela violência
O trabalho de tradução quase foi interrompido em algumas partes de Camarões, devido a uma crise sociopolítica que matou cerca de 6.000 pessoas desde 2017. Mas, mesmo fugindo para salvar a vida, os tradutores continuaram a redigir as Escrituras em seus idiomas. Isaac Genna Forchie, membro da equipe da CABTAL (Associação Camaronesa de Tradução e alfabetização da Bíblia) e natural da região de Bamenda, a noroeste dos Camarões, viajou para algumas das áreas impactadas com o objetivo coletar histórias em primeira mão das equipes de tradução.
“Estávamos gravando a história sobre a Páscoa no idioma Lus quando ouvimos que os soldados estavam chegando”, recorda Jesse Ganglah, Facilitador do Grupo que trabalha na Associação Camaronesa de Tradução e Alfabetização da Bíblia (CABTAL). “Naquele momento, todos estavam fugindo da aldeia porque os soldados irados não tinham tempo para distinguir os separatistas dos civis”.
“Todos corriam o risco de serem mortos a tiros. Vi pessoas com os seus colchões, esteiras e outras coisas, além de crianças fugindo para os arbustos e para a Nigéria. Eles deixaram o computador para trás, mas um tradutor enfrentou todas as probabilidades e voltou para buscá-lo".
Essa narrativa retrata uma das inúmeras experiências enfrentadas pelos tradutores da Bíblia no noroeste e sudoeste dos Camarões, quando confrontados com uma intensa crise sociopolítica que ameaçou quase paralisar o processo de tradução. Apesar de todas as adversidades, eles completaram nove Novos Testamentos nos últimos dois anos.
Sobre a Violência
O tumulto civil em andamento iniciou quando advogados e educadores anglófonos deixaram suas atividades em outubro de 2016, protestando contra o que perceberam como uma "tentativa deliberada" por parte do governo central de suprimir dois de seus valores culturais fundamentais: o sistema jurídico do Direito Comum e o modelo de educação Anglo-Saxônico.
O governo respondeu com uma repressão feroz à dissidência. O que resultou numa escalada de tensões e em novos confrontos à medida que emergia um movimento separatista. A condição evoluiu para um conflito armado em curso, resultando na perda de aproximadamente 6.000 vidas e no deslocamento de mais de 765.000 pessoas. Dentre esses, 70.000 buscaram refúgio na Nigéria, incluindo tradutores que fugiram levando consigo seus computadores. Alguns enfrentaram mais uma ameaça do Boko Haram.
Um dos projetos que enfrentou a crise foi o do idioma Ngwo, que é falado no noroeste dos Camarões.
“Como não terminamos a nossa tarefa em um único dia em 2017, decidimos levar os nossos computadores para casa”, lembra Siphra Nde. Essa acabou sendo a razão pela qual seus computadores foram poupados. “Quando saímos, toda a praça do mercado, incluindo o escritório do projeto, foi incendiada”.
“Esse foi o último dia em que usamos o escritório”, diz ela.
Enquanto outros fugiram para a natureza em busca de segurança, foi ainda mais difícil para Nde, de 54 anos, que vivia com crianças e os seus pais idosos.
No dia seguinte, caminharam pela mata até um local próximo à capital regional, Bamenda. “Clamamos à CABTAL e eles enviaram um carro que nos transportou para um local seguro em Bamenda”, diz Nde.
“Caminhamos por mais de 10 horas. Chegamos a Bamenda com todo o choque de enfrentar mais um desafio – não ter lugar para dormir”.
Seu primo a hospedou por duas semanas antes de ela finalmente alugar um pequeno quarto onde ela, as crianças e seus pais idosos viveram por vários anos.
Trabalho em Meio a Tiros
Sob a mira de uma arma, outros como Protus Effange tiveram de provar que eram apenas tradutores da Bíblia e não espiões. “Você tem certeza de que está fazendo a obra de Deus?” os homens armados perguntaram ao tradutor Bakwere.
“O nosso bairro de escritórios em torno de Muea tornou-se um campo de batalha para os separatistas e soldados”, diz Effange. As atividades de alfabetização e de envolvimento com as Escrituras chegaram ao fim.
“Lembro-me de uma vez em que tivemos um determinado workshop”, diz Effange. “Nós nos reunimos e oramos e estávamos prestes a começar quando ouvimos tiros estrondosos que nos dispersaram”.
Privados da Palavra de Deus
Dado que a tradução da Bíblia é uma tarefa complexa e desafiadora que requer dedicação, experiência e colaboração, crises como estas em todo o mundo representam uma grave ameaça. A violência, o deslocamento, a insegurança, a falta de recursos e de comunicação podem atrasar, suspender ou cancelar projetos. Ela privou milhões de pessoas de acessar à Palavra de Deus em seus próprios idiomas. Em 2020, cerca de 30 projetos de tradução foram suspensos na vizinha Nigeria devido ao terrorismo. Noutros lugares, a guerra entre a Ucrânia e a Rússia continua a representar um grande perigo para a tradução da Bíblia nas antigas nações soviéticas.
Novos Desafios Estimulam a Inovação
Desafios semelhantes causaram o mesmo efeito em Camarões, mas levaram a CABTAL a pensar além do comum.
“Antes da crise, os tradutores podiam viajar livremente pelas comunidades para redigir as Escrituras sem qualquer medo, os alfabetizadores circulavam com facilidade e os consultores podiam viajar pelas comunidades. Mas tudo mudou de repente”, afirma Emmanuel Keyeh, Diretor Geral da CABTAL.
“Tornou-se difícil para as pessoas se reunirem em um só lugar”.
Isso trouxe incerteza. Mas o pior não aconteceu, pois a CABTAL ajudou tradutores que fugiram com os seus computadores e rascunhos para áreas mais seguras e para a vizinha Nigéria.
“Mudamos alguns para áreas onde poderiam ter acesso a consultores de tradução”, diz Keyeh.
O acesso às necessidades básicas tornou-se um desafio.
“A CABTAL deu-nos alguns sacos de arroz e um pouco de dinheiro extra para o nosso sustento”, diz Siphra Nde. Ela pôde então continuar a redigir o Novo Testamento no idioma Ngwo.
As atividades de alfabetização deixaram de ser tradicionais e assumiram um novo formato. “Incentivamos as comunidades a se envolverem na alfabetização urbana e digital”, diz Keyeh. Quando as escolas fecharam, os professores de alfabetização do idioma Ngwo seguiram os alunos até às igrejas e aos seus esconderijos, onde o ensino e a aprendizagem continuaram.
Frutos que Trazem Esperança
Tal como as equipes do Ngwo e Bakwere, os idiomas Mankon, Ngie, Moghamo, Essimbi, Mmen, Esu e Weh tiveram as suas próprias experiências únicas. Mas a sua grande esperança está no Novo Testamento recentemente concluído nestas línguas, que foi composto e enviado para impressão. As comunidades estão agora levantando fundos e mobilizando-se para a dedicação.
Antes de falecer no ano passado, o respeitado líder tradicional Mankon, Fon Angwafo III, expressou alegria ao receber a cópia traduzida pelos tradutores.
“Ele apresentou-o aos pastores e destinou-nos um terreno para construirmos um centro de alfabetização onde também poderíamos traduzir o Antigo Testamento”, diz Magerate Ndenge, um tradutor do idioma Mankon.
A equipe do Bakwere espera um grande impacto. Um dos tradutores recorda a visita a um ancião, guardião de seu idioma.
“Ele também estava doente, mas queríamos que ele ouvisse e confirmasse a naturalidade de uma parte das Escrituras que traduzimos”, diz Protus Effange. O guardião convidou todos os seus filhos e netos para a reunião.
“Enquanto lia, vi lágrimas escorrendo de seus olhos. Parei e perguntei se as dores estavam piorando. E ele respondeu dizendo: ‘Você está lendo palavras ao meu coração'".
O homem que não conseguia ficar de pé levantou-se de repente e caminhou para se despedir dos tradutores a medida que voltavam para casa.
Effange aguarda com ansiosamente o impacto que todo o Novo Testamento criará em sua comunidade. Uma data de dedicação inicial foi marcada, mas posteriormente adiada porque o Novo Testamento não chegou como inicialmente esperado.
“Parece-nos estranho que mesmo com a situação sócio-política, a produtividade tenha aumentado bastante”, diz Keyeh, Diretor Geral da CABTAL. Ele acrescenta que a inovação deu às pessoas da diáspora a oportunidade de aprender a ler e escrever em seus idiomas, virtualmente ou pessoalmente.
“Os desafios surgiram, mas com os ajustes, estamos vendo alguns resultados formidáveis do que Deus está fazendo nessas comunidades”.
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História: Isaac Genna Forchie, CABTAL
As organizações da Aliança podem baixar e usar as imagens deste artigo.
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